Resenha ABERST: O Capeta Caolho Contra a Besta-Fera

...o que era de se esperar de um canto de terra esquecido no meio de Pernambuco, lugar mirrado e cheio de sofrimento onde o homem plantava tristeza, regava com lágrimas e colhia desespero. Terezinha de Moxotó era um buraco, daqueles bem fundos, onde a luz não bate. Nesses lugares, manda quem pode, obedece quem aprendeu que desobediência mata".

Praticamente ler o livro de Everaldo Rodrigues, foi para mim, uma aventura sem volta. Sair com ele desbravando o sertão nordestino é um rumo tenso, sombrio, triste, real demais para aguentar o peso no ombros.

"O Capeta Caolho Contra a Besta-Fera" é muito mais que só um livro de horror sobrenatural, é uma lição de história e de geografia; passa na nossa frente como um filme, desses independentes, que pouca gente vê, mas quem assiste sai com os olhos lacrimejados, o coração disparado e cheio de medo, e não esquece nunca.

Vai para a prateleira como um dos meus favoritos.

Um livro rápido, mas tão rápido que chega a doer. Você quer que acabe para saber o fim, mas quando o fim se aproxima você desacelera porque quer ficar um pouco mais na história.

Eu não cresci no sertão, mas cresci no interior de São Paulo, na minha época a cidade ainda era pequena e sem graça, e os 'contos' que os antigos passavam para nós, crianças, era muito parecida com a que Everaldo descreve aqui com tanta precisão. Foi uma viagem no tempo. Parece que conseguia ouvir meu vizinho, um senhorzinho de quase 100 anos, contando a história da vila para nós, que sentávamos ao seu redor com os olhos arregalados e morrendo de medo. Essas noites meu travesseiro tinha um destino certo: a cama da minha avó...

Everaldo nos conduz, literalmente, ao fim do mundo, onde nem cristo tem pena ou se lembra da sua existência. Terezinha de Moxotó - lugar de ninguém, esquecida no tempo - passa a contar, nas noites de lua cheia, com o aparecimento de um lobisomem. Sem ter ninguém para ajudá-los, precisam vender suas almas ao diabo e conseguir a ajuda do Capeta Caolho e seus cangaceiros sangrentos e marginais, para combater a Besta-Fera. É a última esperança.

A história nos relata essa luta sangrenta onde não se sabe direito o que é pior: a Besta-Fera ou Capeta Caolho e seu bando aterrorizante. A jornada de Zé Mindim, um sertanejo mirrado e medroso pelo sol escaldante do sertão em busca do bando é uma lição dura e sombria de como a nossa ignorância nos transforma em seres absolutamente incapazes e mentalmente falidos.

Para mim foi muito mais que uma história de horror, de sobrenatural, foi uma viagem na geografia de um país grande demais para ser descoberto, mas que Everaldo conseguiu me levar a conhecer através dessa 'deliciosa' história de medo, de vingança, de miséria e de esquecimento.

Sejam bem-vindos ao sobrenatural pela porta da frente, porque só conseguirão sair correndo pela porta dos fundos, ou a que tiver mais próxima, com certeza...

Muito recomendado!
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Cláu!