Resenha: Eu Sei Por Que o Pássaro Canta na Gaiola - #MulheresEmFoco

Título: Eu Sei Por Que o Pássaro Canta na Gaiola
Autor: Maya Angelou
Editora: Astral Cultural (pela TAG Curadoria)
Páginas: 336
Ano: 2018
Onde Comprar: Amazon
Sinopse: Racismo. Abuso. Libertação. A vida de Marguerite Ann Johnson foi marcada por essas três palavras. A garota negra, criada no sul por sua avó paterna, carregou consigo um enorme fardo que foi aliviado apenas pela literatura e por tudo aquilo que ela pôde lhe trazer: conforto através das palavras.
Dessa forma, Maya, como era carinhosamente chamada, escreve para exibir sua voz e libertar-se das grades que foram colocadas em sua vida. As lembranças dolorosas e as descobertas de Angelou estão contidas e eternizadas nas páginas desta obra densa e completamente atual.

Os alunos brancos teriam a chance de se tornar Galileus e Madames Curie e Edisons e Gauguins, e nossos garotos (as meninas nem estavam na conta) tentariam ser Jesses Owens e Joes Louis."

O que dizer desse livro? Um livro que no momento que bati os olhos, quis ler, mas que não sabia o que esperar dele. Eu Sei Por Que o Pássaro Canta na Gaiola é uma autobiografia, mas também é muito mais do que isso. É um relato do racismo dos anos 30/40 em um EUA totalmente segregado. É um relato da violência e que ela surge da onde menos se espera. Triste, mas real, Eu Sei Por Que o Pássaro Canta na Gaiola tem uma força na narrativa que fazia muito tempo que não encontrava.
Quando comecei a ler, não sabia que esse livro era uma autobiografia de memórias sobre a infância e juventude da autora. Sabia da importância de Marguerite Ann Johnason (mais conhecida como Maya Angelou), mas não conhecia seus escritos e ao pesquisar um pouco mais sobre a vida dela, descobri duas coisas: primeiro, que ela tem muitos livros de poesia e esses não me interessam; segundo, que ela tem algumas autobiografias, incluindo esse, mas tem também uma que relata a sua história com a sua mãe, intitulado Mamãe & Eu & Mamãe, um livro que tenho! Olha só que grata coincidência.
O livro todo é narrado em primeira pessoa e apesar de seguir uma linearidade, Maya vai nos apresentando os momentos que ela acha mais importante, então algumas vezes temos um pulo de tempo.
Maya Angelou (apelido dado pelo irmão) se mudou aos três anos de idade da cidade de Long Beach, Califórnia, onde morava com os pais e o irmão, depois do divórcio dos dois e foi morar com a avó em Stamps, Arkansas, estado do sudeste dos EUA. Sabemos que a região Sul do país foi por muito tempo (e ainda é) a parte mais racista do país, tanto que foram os últimos estados a acabar com a escravidão e com a segregação racial.
Durante o livro, vemos o quão sofrida era a vida dos negros naquela época e principalmente naquele lugar. A avó era dona de um Mercado e sua vida se resumia a ajudar com a loja e fazer os deveres em casa. Por esse fato, a vida financeiramente deles não era tão difícil, mas ela sempre testemunhava o quanto os catadores de algodão trabalhavam e mesmo assim, recebiam quase nada.
O racismo estava o tempo todo presente. Seja na vez em que o seu tio teve que se esconder em um tonel para não ser linchado; ou quando um grupo de meninas brancas humilham a sua avó no Mercado; ou ainda a cena de quando ela, junto com a avó, vão pedir ajuda à um dentista branco; e para mim, a pior cena: o dia da formatura, onde um político branco chega para fazer um discurso totalmente preconceituoso, dizendo que os negros sempre devem se contentar com menos e se tiverem sorte, podem até virar atletas. Para entenderem um pouco essa cena, a citação do começo da resenha é o sentimento da autora após esse discurso horrível.
Existem diversos outros momentos em que a cor dela será diminuída, mas acho essas quatro as mais revoltantes. Depois de alguns anos, ela volta a morar com a mãe na Califórnia e ali ela sofrerá outro tipo de violência, vindo da onde ela menos espera: da própria família, ou melhor, do padrasto. E tudo que ela irá passar depois disso é muito triste.
Com 16 anos, ela se muda com o irmão e com a mãe para São Francisco, onde ela começará a trabalhar nos bondes da cidade e se tornará a primeira negra a trabalhar neste local. Depois de dezenas de reuniões com empresas, ela continuava a não desistir, pois ela queria trabalhar ali e ninguém a impediria. Naquele momento, ela percebe que a luta não é só dela ou só para ela, mas que era para toda uma raça e estava apenas começando!
Esse livro é maravilhoso. Forte. Real. Triste. Um livro de memórias que não conta a história de uma única pessoa, mas dos catadores de algodão, da avó, do irmão, de Joe Louis, como a frase seguinte consegue apresentar bem:

"Ele encurralou Louis nas cordas e agora foi um de esquerda no corpo e um de direita nas costelas. Outro de direita no corpo; parece que ele bateu baixo... Sim, senhoras e senhores, o árbitro está sinalizando, mas o oponente continua golpeando Louis. Outro no corpo, e parece que Louis está caindo."
Minha raça gemeu. Era nosso povo caindo. Era outro linchamento, mais um Negro enforcado em uma árvore. Mais uma mulher emboscada e estuprada. Um garoto Negro chicoteado e ferido. Eram cachorros na trilha de um homem correndo por pântanos gosmentos. Era uma mulher branca estapeando a empregada por ser esquecida.
[...] Podia ser o fim do mundo. Se Joe perdesse, estaríamos de volta à escravidão, sem chance de ajuda. Seia tudo verdade, as acusações de que éramos do tipo mais baixo do ser humano. Só um pouco acima dos macacos. Seria verdade que éramos burros e feios e preguiçosos e sujos e sem sorte e, pior de tudo, que o Próprio Deus nos odiava a nos mandava ser carregadores de madeira e coletores de água para sempre, sem nunca ter fim."

Um livro que todos deveriam ler. Apesar da questão racial ter diferença nos EUA e no Brasil, em ambos os países os negros sofreram e ainda sofrem demais. Como uma mulher branca e portanto, privilegiada nesse sentido, eu já fui impactada, imagino para os negros. A dor deve ser muito maior. Mas acredito que a vontade de lutar pelos seus direitos depois do término desse livro deve surgir com uma força muito grande.
Para quem ficou interessada na história da Maya Angelou, na Netflix tem um documentário sobre ela, intitulado Maya Angelou, E Ainda Resisto.
E se vocês querem saber por que o pássaro canta na gaiola, deixarei a última frase do prefácio escrito pela Oprah:

Ela falava com orgulho, com audácia e com frequência:
"Nós somos mais parecidos do que somos diferentes!"
Essa verdade é o motivo de podermos todos ter empatia, de podermos todos ficar emocionados quando o pássaro canta na gaiola."

Até a próxima e boa leitura!

10 comentários

  1. Confesso que o contexto do livro me pareceu um pouco confuso, acredito que seja uma obra que eu tenha que pegar e ler para compreender tudo o que você sentiu com a leitura.

    www.estante450.blogspot.com

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  2. Oiii, tudo bem? Fiquei curiosa com a obra, parece ser uma leitura muito necessária, vou esperar a editora lançar ♥
    Um beijo.

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  3. Olá!
    Esse tipo de leitura tem tomado cada vez mais o meu interesse e principalmente por trazer tantos elementos reais e necessários ser abordado.
    Não conhecia essa história mas gostei das suas impressões e ver que a leitura te impressionou.

    Camila de Moraes

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  4. Essa leitura parece ser bem sensível, gostei da proposta. Confesso que não conhecia a obra, mas sua resenha me deixou muito encantada e preciso ler logo!
    beijos

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  5. Oi, Carol! Parece ser um daqueles livros que cada parte é um soco no estômago. Já tinha visto esse livro em livrarias, mas não sabia que seu conteúdo seria tão forte e envolvente.
    Bjos
    Lucy - Por essas páginas

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  6. Parece ser uma leitura polêmica, mas necessária.Confesso que fiquei bem curioso para saber da trama na íntegra. Anotada a dica.

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  7. Eu li Mamãe & eu& mamae da Maya e foi uma leitura bastante profunda, mexeu demais comigo, a maneira como ela trabalha as questões raciais é dolorosa mas muito necessária, principalmente na literatura. Essa edição é linda e espero adquirir assim que possível.

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  8. Oi Carol! Eu estou com os livros dessa autora na minha lista de leituras urgentes e necessárias! É tão triste olharmos para o passado e ver quanta maldade e crueldade foi ( e ainda é ) feita com as pessoas por um pensamento errôneo de superioridade! E é mais triste saber que ainda hoje continuamos a ter esse pensamento propagado. Obrigada pela resenha tão emocionante!

    Bjoxx ~ Aline ~ www.stalker-literaria.com ♥

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  9. Chorei só de ler a resenha, imagina o livro... quero muuuuuito esse livro.

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  10. Esse livro foi tão emocionante pra mim... Lendo tua resenha me veio toda nostalgia. Bjs Monalise www.dividindoexperiencoas.com

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