Resenha: As Três Marias


Título: As Três Marias
Autor(a): Rachel de Queiroz
Editora: José Olympio
Páginas: 224
Ano: 2017
Onde Comprar: Amazon
Sinopse: Em seu quarto romance, As Três Marias, a escritora cearense Rachel de Queiroz foi ainda mais fundo em um tema que já estava presente em todas as suas obras anteriores: o papel da mulher na sociedade. A história tem início nos pátios e salas de aula de um colégio interno dirigido por freiras: Maria Augusta, Maria da Glória e Maria José são amigas inseparáveis que ganham de seus colegas e professores o apelido de "as três Marias". À noite, deitadas na grama e olhando para o céu, as meninas se reconhecem na constelação com a qual dividem o nome. A estrela de cima é Maria da Glória, resplandecente e próxima. Maria José se identifica com a da outra ponta, pequenina e trêmula. A do meio, serena e de luz azulada, é Maria Augusta - ou simplesmente Guta, como sempre preferiu ser chamada.

Noites sem sono, noites compridas, intermináveis; olhos secos, o corpo rolando na cama, sem achar macio onde se acomode, as mãos cavando buracos fofos no travesseiro, cansaço, um tal cansaço! Preguiça do dia que vai amanhecer, das coisas eternas, imutáveis, que se irão repetir implacavelmente. E sonhar, sonhar com uma felicidade impossível, numa morte doce e rápida, sem dores e sem miséria, uma morte feliz e sorrateira como um sono, justamente como sesse sono que está faltando."

Escrita em 1939, As Três Marias é a obra mais intimista e autobiográfica de Rachel de Queiroz, uma das mulheres mais relevantes da literatura brasileira.
Segundo Elvia Bezerra, pesquisadora, toda a ambientação e personagens do livro se relacionam com a autora. A ação se incia no tradicional Colégio da Imaculada Conceição, em Fortaleza, onde Rachel de Queiroz, assim com Elvia, chegou a estudar, aos 12 anos de idade, vinda de sua fazenda em Quixadá. Nascia desse modo, a primeira das três Marias. Ali fez amizade com duas colegas, Odonira Pinheiro Castelo Branco e Alba Frota, que se tornariam amigas até o fim da vida e inspirariam as outras duas Marias.
Rachel usou da liberdade da escrita para mudar o destino das amigas, em outros momentos usou dos traços originais de suas personalidades, mas sem deixar de reconhecer quem era cada Maria.
A obra é o relato do encontro de três mulheres, ainda na infância, no colégio interno, e de suas trajetórias no cenário urbano que as recebe posteriormente. Escrita em primeira pessoa, acompanhamos essa passagem na vida dessas meninas-moças dentro de uma instituição segregada. De um lado, meninas ricas que aprendiam a se comportar, a serem recatadas para se tornarem boas esposas e mães. Do outro lado, o Orfanato, onde meninas órfãs aprendiam desde cedo a trabalharem duro, assumir a sua pobreza e penar em seus caminhos tortuosos. E no centro de tudo, o espaço sagrado e intocável das irmãs.
E quem são essas Marias?
Temos a destemida Maria Augusta, a Guta, que é a nossa narradora e provavelmente a nossa Rachel. As outras duas são Maria da Glória, órfã de pai rico, sonhadora e sentimental; e Maria José, uma católica fervorosa. Dessa amizade nasce o apelido Três Marias em referência a constelação. Uma amizade intensa que irão compartilhar mesmo depois de deixarem para trás os muros do colégio.
Mesmo quando todas as suas personagens femininas são pessoas fortes - uma linguagem feminista - a autora não gostava que a ligassem ao movimento.
A representação social da mulher e todas as expectativas que lhe são impostas são referências constantes no decorrer da história. Desde a infância no internato, as protagonistas sofrem com a repressão em um cenário onde escola e igreja, unidas, tolhem as liberdades e moldam o perfil da mulher bem comportada, obediente, doméstica, onde o homem representa o elemento emancipador. E apesar das escassas opções em seus caminhos, Guta será nossa personagem forte que tomará atitudes transgressoras.
Acompanhamos o caminho dessas três amigas, suas derrotas, suas decepções, seus amores. Uma história intimista, mas nem as Marias, nem os sentimentos adolescentes, nem os ecos da memória de nossa escritora imprimiriam qualquer desvio no ofício literário da ficção.
E, apesar de Rachel rejeitar qualquer ligação com o movimento feminista, é impossível não notá-lo na sua história, na beleza e ousadia de seus livros e de suas personagens.

O trem penetra no sertão, na noite, na fuga. E eu vou com ele, vou dentro dele, sou parte dele.
[...] Olho as Três-Marias, juntas, brilhando. Glória reluz, impassível, num raio seguro e azul. Maria José, pequenina, fulge tremendo, modesta e inquieta como sempre. E eu, ai de mim, brilho também, hei de brilhar ainda por muito tempo - e parece que a minha luz tem um fulgor molhado e ardente de olhos chorando."

O Que Acontecia na Época:

  • Em 1936, estréia uma grande sucesso do cinema, Tempos Modernos, de Charles Chaplin;
  • Em 1937, Pablo Picasso faz o seu protesto contra a Guerra Civil Espanhola, pintando a obra Guernica;
  • Em 1939, a Alemanha invade a Polônia dando início a Segunda Guerra Mundial;
  • Em 1939, estréia o filme O Mágico de Oz, com a atriz Judy Garland;
  • Em 1939, temos outra grande estréia, E o Vento Levou, com o astro Clark Gable e a inglesa Vivien Leigh;
  • Em 1939, estava tocando nas paradas musicais Carmen Miranda, com O Que é Que a Baiana Tem? e de Silvio Caldas, No Rancho Fundo.




Até a próxima!

7 comentários

  1. OI Claudia, tudo bem??

    Conhecia a obra de nome, mas não lembrava muito do enredo... Gostei de ler sua resenha para me situar um pouco... Você sabe o motivo da autora não querer ligação com o movimento feminista? Achei muito bacana saber que a obra é inspirada na própria autora e suas amigas.
    Fiquei curiosa em ler e saber quais os finais escolhidos para as mesmas.

    A resenha está ótima!

    Beijinhos,
    Ani
    www.entrechocolatesemusicas.com.br

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    1. Oi, Ani!
      Não sei ao certo o por que dessa resistência da autora em relação ao movimento, mas acredito eu, deve ser devido a época. Em nenhuma biografia da Rachel fica claro o porque, mas sempre deixam bem claro que ela repudiava essa comparação.
      É estranho, já que em todos seus livros, suas personagens são sempre mulheres fortes e batalhadoras.
      Então, a única coisa que acabo deduzindo seja mesmo a falta de informação da mesma pelo movimento junto com algum tipo de conservadorismo. Mas é só um "achismo"!
      Abraço

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  2. Olá, tudo bem? Acredita que não conhecia a autobiografia. A história no todo não me parece desconhecida (já devo ter ouvido falar ou lido sobre em algum lugar) o que pode me animar a tentar ler algo do estilo. Gostei das suas impressões e o que sentiu da obra. Enfim, que sabe um dia?! Ótima resenha!
    Beijos

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  3. Fiquei impressionada ao fato da autora não gostar da ligação da história ao feminismo. Pelo enredo do livro deixa bem claro que tem um forte envolvimento e foi isso que fez meus olhos brilharem. E estou impressionada pelo fato de ter sido baseado em sua própria experiência pessoal, alterando as peças necessárias para a escrita do livro.
    Gosto muito de me envolver nesse passado, onde as escolas católicas e igrejas eram as dominadoras, é sempre bom estar de olhos abertos para o passado!
    Um livro que entrou para os meus desejados <3

    https://bibliotecandoblog.blogspot.com/

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  4. Que bacana essa relação direta do livro com a autora. Eu ainda não li nada dela, mas é algo que será feito em algum momento da minha vida, assim como a leitura de outros autores importantes. Eu gosto muito de ler histórias focadas em mulheres, ainda mais quando a trama é ambientada em outro momento da história da sociedade. Gosto de fazer paralelos e infelizmente a gente consegue observar que as coisas não melhoraram tanto assim para nós. Ótima resenha!

    Beijos
    - Tami
    https://www.meuepilogo.com

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  5. Olá, tudo bom?
    Não conhecia o livro, mas adoro quando ele apresenta essa relação direta com a autora, visto que é uma autobiografia, de uma forma mais intimista. Fiquei bem curiosa para conferir como essas três mulheres se conheceram e dificuldades e lutas que travaram ao longo da vida. Adorei a contextualização histórica feita no final da resenha. Dica anotada ♥
    Beijos!

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  6. Olá Claúdia!!!
    Eu já tinha ouvido falar do livro e é um dos livros da autora Rachel de Queiroz que tenho muita vontade de ler.
    Eu acho interessante ver as referências com a vida pessoal da autora e como ela manteve traços do que aconteceu mesmo na vida dela.
    Adorei a resenha e esses fatos ainda curiosos da época que a história se passa!!!

    lereliterario.blogspot.com

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