Resenha: O Livro do Chá

Título: O Livro do Chá
Autor(a): Kakuzo Okakura
Editora: Estação Liberdade
Páginas: 136
Ano: 2008
Onde Comprar: Amazon
Sinopse: Escrito em 1906, O livro do chá promove uma reflexão, a partir da história e da descrição desse cerimonial, sobre o antagonismo entre tradição e modernidade. Escrita propositalmente em inglês, a obra tem como um dos objetivos tornar a tradição oriental conhecida e respeitada no Ocidente. O poder contido na simplicidade, a potência oculta nos pequenos gestos quando executados com perfeição, a influência do taoísmo e do zen no cerimonial do chá - são esses alguns motes desenvolvidos no livro, de modo poético e conciso.

Apenas aquele que conviveu com o belo é capaz de morrer belamente."


Como é interessante você se conectar com um livro que, em poucas páginas, lhe ensina tantas coisas.
Percorremos todo o caminho da história do chá, desde seus primórdios, no século VIII, na China, onde era consumido como remédio, até subir de status, no século XV, no Japão, quando foi elevado a categoria de religião estética, ou seja, à de "chaísmo".
A planta do chá, nativa do sul da China, era desde a antiguidade velha conhecida da botânica e da medicina chinesa. Por volta dos séculos IV e V, o chá se tornou a bebida favorita dos habitantes do vale do Yangtsé Kiang. Foi aproximadamente nessa época que os chineses cunharam o moderno ideograma cha ().
Chado - literalmente "o caminho do chá" - ou ainda chanoyu - amplamente conhecido como "a cerimônia do chá" - apesar de toda aura de mistério, nada mais é que um pequeno grupo de amigos que se reúnem durante algumas horas para compartilhar uma refeição, tomar um pouco de chá e dar uma breve trégua aos negócios e aos cuidados diários.

A chanoya representa o verdadeiro espírito da democracia oriental ao tornar todos os seus adeptos aristocratas de bom gosto."

Kakuzo Okakura também abre um amplo campo de discussão a respeito de como o Ocidente enxerga o Oriente e suas peculiaridades. Reforça constantemente que a humanidade tem se encontrado numa xícara de chá, - o único ritual asiático que merece o apreço de todos. O homem branco ironiza a região e os costumes asiáticos, mas aceita a bebida marrom sem hesitar.




A compreensão por parte de Okakura da chanoyu, que surgiu de seu vasto conhecimento do chinês, teve as suas raízes em valores religiosos budistas, taoístas e confucianos. Entre os budistas, a seita zen sulista, que incorporou tantos aspectos da doutrina taoísta, formulou um elaborado ritual do chá. Os monges se reuniam perante a imagem de Bodhi Dharma e, com a formalidade profunda de um sacramento, bebiam o chá de uma única tigela. E foi esse ritual zen que se transformou na cerimônia do chá japonesa no século XV. O chá agora é tomado em infusão, ou seja, mergulhando-se as folhas em tigela ou xícara de água fervente. A razão pela qual o Ocidente desconhece os métodos mais antigos de se tomar chá é pelo fato da Europa te-lo apenas conhecido no final da Dinastia Ming.

Aqueles incapazes de sentir em si mesmo a pequenez das coisas grandiosas tendem a ignorar nos outros a grandiosidade das pequenas coisas."

No século XVI foi criado o primeiro aposento do chá independente, uma criação de Sen-no-Soeki, conhecido posteriormente como Rikyu (Sen Rikyu - 1522-1591), o maior de todos os mestres "chaístas". Rikyu instituiu e elevou as formalidades da cerimônia do chá a um alto grau de perfeição.
As pessoas que participavam de cerimônias chanoyu nos tempos de Rikyu eram principalmente senhores feudais, guerreiros da classe dominante e mercadores ricos. Todos os convidados da classe guerreira tinham, inicialmente, de remover as suas espadas - o símbolo da classe - antes de rastejar pela entrada. Até mesmo ao governante da nação era exigido que assim procedesse. Ao entrar dessa maneira no aposento do chá e se desfazer de seus status na rígida estrutura social feudal, todos assumiam igual postura e passavam para um reino em que as pessoas são respeitadas, sobretudo, por sua humanidade.
Numa passagem do Sutra Lótus, um pai chama seus filhos de uma casa em chamas para segurança de uma roji (solo orvalhado). A casa em chamas simboliza a penosa existência da ignorância e do apego a si mesmo, e os praticantes da chanoyu consideram que a roji é o local para abandonar as confusões do mundo.
Segundo Okakura, no âmbito religioso, o futuro está no nosso passado. No artístico, o presente é eterno. O mestres do chá sustentavam que a apreciação real as arte é apenas possível para os que fazem dela uma influência viva. Assim, procuravam regular o cotidiano deles de acordo com o alto padrão de elegância que obtinham em aposentos do chá. A serenidade mental devia ser mantida em todas as circunstâncias, e a conversação, conduzida de maneira a nunca prejudicar a harmonia do ambiente. O corte e a cor da roupa, a postura física e a maneira de andar - tudo podia se tornar expressão de personalidade artística. Essas questões não deviam ser levianamente ignoradas, pois até que nos façamos belos não temos o direito de nos aproximar da beleza. Assim, o mestre do chá se esforçou para ser algo mais que artista, ou seja, ser a própria arte. Era o zen estético. A perfeição está em toda parte se apenas nos dignarmos a reconhecê-la.
Como um meio de adestramento, a cerimônia chanoyu oferece um abrangente modelo de vida. Serve como constante lembrete dos valores básicos de um povo através do tempo, valores esses que emergem da sabedoria e da experiência milenar das tradições asiáticas. Não prega nenhuma doutrina religiosa. Sua grande força repousa na solidez de suas formas; e seu fundamento, na mais básica das atividades humanas: a de nos sentarmos em companhia de outras pessoas afim de partilhar uma refeição e tomar um pouco de chá.
O Livro do Chá é uma viagem grandiosa pela Ásia, por suas vias desconhecidas, lotadas de histórias e sabedoria. É como emergir em um mundo distante, de olhos fechados, e descobrir que tudo que temos e acreditamos têm raízes profundas no outro lado do mundo. Raízes que o tempo só faz bem, só acrescenta. E a sabedoria não cabe a um único indivíduo, país, crença ou classe. A sabedoria está enraizada na história, é milenar, não define raça, passa de geração em geração. Um livro de poucas páginas, instigante e infinitamente rico em informações. Uma história que acrescentou muito na minha leitura, enriqueceu meu status de leitora e que vou levar para sempre.
Obrigada, Kakuzo Kakura, aonde quer que você esteja. Muito obrigada!

Não esqueçam de adquirir o livro pelo nosso link, que está no começo da resenha.

Até a próxima!

5 comentários

  1. Olá!

    Fiquei surpresa agora, não sabia que existia um livro contando a trajetória dos chás. Sou suspeita pra falar, pois em qualquer ocasião eu estou tomando chá, principalmente para relaxar ou quando estou doente rs
    Adorei saber um pouquinho dessa trajetória!

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  2. Muito instigante essa obra, estou muito curioso de saber mais sobre o assunto, além de admirar e gostar demais de literatura japonesa. Essa obra lerei, com certeza.

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  3. Que livro interessante!
    Não conhecia...
    Não é o tipo de literatura que eu costume ler, mas sua resenha ficou tão linda que me deixou curiosa com a leitura!
    Dica anotada!
    Parabéns pela resenha!!

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  4. Oi, tudo bem?
    Eu confesso que não conhecia esse livro e não é muito meu estilo de leitura. Amo chá, mas nunca parei para pensar muito sobre o assunto. Porém, acredito que seja interessante para conhecer mais sobre a cultura oriental, que é tão rica e cheia de conhecimentos. Adorei a resenha e fico feliz que tenha aproveitado tanto a leitura.
    Beijos!

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  5. Mesmo eu amando Chá, desconhecia o livro e desconheço a história em si e já fiquei master curiosa.
    Amei a dica.

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